O princípio de superposição

Seja $q$ o conjunto das coordenadas de um sistema quântico 3, e $dq$ o produto das diferenciais dessas coordenadas 4. Por exemplo, se $q = \{x,y,z\}$, $dq=dx dy dz$.

O estado de um sistema é descrito por uma função complexa $\psi(q)$ das coordenadas. O quadrado do módulo dessa função determina a distribuição de probabilidades dos valores das coordenadas:

\begin{displaymath}
\vert\psi(x,y,z)\vert^2 dx dy dz
\end{displaymath}

é a probabilidade de que uma medida realizada sobre o sistema encontre os valores das coordenadas entre $x$ e $x+dx$, $y$ e $y+dy$, $z$ e $z+dz$. A função $\psi$ é denominada função de onda do sistema.

O conhecimento da função de onda permite, em princípio, calcular a probabilidade dos vários resultados de qualquer medida (não necessariamente das coordenadas). Essas probabilidades são expressões bilineares em $\psi$ e $\psi^*$ (* representando a operação de tomar o complexo conjugado), do tipo

\begin{displaymath}
\int dq \psi(q)^* \phi(q) \psi(q)
\end{displaymath}

ou

\begin{displaymath}
\int dq \psi(q)^*\frac{\partial}{\partial q} \psi(q)
\end{displaymath}

por exemplo.

O estado de um sistema varia, em geral, com o tempo. Em conseqüência, a função de onda é uma função também do tempo, $\psi(q,t)$. Se a função de onda é conhecida em um instante inicial, segue, do conceito da descrição completa, que ela está, em princípio, determinada em cada instante sucessivo. A dependência precisa da função de onda com o tempo é determinada por uma equação denominada equação de Schrödinger .

A probabilidade de que as coordenadas de um sistema tenham qualquer valor, é 1. Devemos, então, ter

\begin{displaymath}
\int \vert\psi(q)\vert^2 dq =1\; ,
\end{displaymath}

pois a integral acima é exatamente esta probabilidade.

Seja $\psi(q)$ a função de onda de um sistema. Considere a função

\begin{displaymath}
\psi^{\prime}(q)= \psi(q)e^{i\alpha}
\end{displaymath}

onde $\alpha$ é um número real. Como as probabilidades dos vários resultados são expressões da forma

\begin{displaymath}
\int dq \psi^*(q) \phi(q)\psi(q)
\end{displaymath}

e como

\begin{displaymath}
\int dq \psi^*(q) \phi(q)\psi(q)= \int dq \psi^{\prime *}(q) \phi(q)\psi^{\prime}(q)\;,
\end{displaymath}

vemos que $\psi^{\prime}(q)$ é uma descrição da função de onda do sistema tão boa quanto $\psi(q)$. Diz-se , por isso, que a função de onda de um sistema está definida a menos de uma fase, ou seja, que, se $\psi(q)$ é função de onda de um sistema, $\psi^{\prime}(q)$ também é.5

Seja $S$ um sistema físico que pode existir tanto num estado de função de onda $\psi_1(q)$ como no estado de função de onda $\psi_2(q)$. A medida de uma quantidade física $f$ dá, por hipótese, o resultado $f_1$, com probabilidade 1, se o sistema estiver em $\psi_1$, e o resultado $f_2$, também com probabilidade 1, se o sistema estiver em $\psi_2$. Postula-se então que:


(1)Toda função da forma $c_1 \psi_1 + c_2\psi_2$, onde $c_1$ e $c_2$ são números complexos, é também um estado do sistema.
(2)Neste estado, uma medida de $f$ dará ou o resultado $f_1$ ou o resultado $f_2$.


Este postulado é denominado princípio de superposição. Segue dele que a equação de Schrödinger deve ser linear em $\psi$.

Considere um sistema composto de duas partes, e suponha que o estado do sistema seja dado de uma maneira tal que cada uma de suas partes possui uma descrição completa.6 Então as probabilidades das coordenadas $q_1$, da parte 1, são independentes das probabilidades das coordenadas $q_2$, da parte 2. Seja $\psi_{12}(q_1, q_2)$ a função de onda do sistema todo, e $\psi_1(q_1)$ e $\psi_2(q_2)$ as funções de onda das partes 1 e 2, respectivamente. Então,

\begin{displaymath}
\psi_{12}(q_1,q_2) = \psi_1(q_1)\psi_2(q_2) \;,
\end{displaymath}

pois, então,

\begin{displaymath}
\vert\psi_{12}(q_1,q_2)\vert^2 = \vert\psi_1(q_1)\vert^2\vert\psi_2(q_2)\vert^2
\end{displaymath}

o que significa que as probabilidades são independentes.

Se, além disso, essas partes não interagirem, vale ainda a relação

\begin{displaymath}
\psi_{12}(q_1,q_2,t)=\psi_1(q_1,t)\psi_2(q_2,t)
\end{displaymath}

Henrique Fleming 2003