Perturbações dependentes do tempo

Até agora estudamos o efeito de pequenas perturbações sobre um sistema físico, sob a hipótese de que essas perturbações fossem independentes do tempo, como um campo magnético constante, etc. Muito importante para o estudo das propriedades de átomo é investigar o que acontece com ele quando, por exemplo, uma onda eletromagnética o atinge. A luz do Sol, por exemplo, é um campo eletromagnético que varia muito rapidamente mas que, em condições normais, é muito menos intenso do que os campos elétricos e magnéticos do próprio átomo. Então a luz é uma perturbação, mas uma perturbação dependente do tempo. Seja
\begin{displaymath}
\hat{H}=\hat{H}_{0}+\hat{V}(t)
\end{displaymath} (594)

o hamiltoniano perturbado, escrito como a soma de um hamiltoniano $\hat{H}_{0}$, não-perturbado, sobre o qual sabemos tudo, e de uma perturbação $\hat{V}(t)$, onde a perturbação, agora, depende do tempo. Esta é uma dependência explícita no tempo. Vamos explicar por meio de um exemplo: suponha dois elétrons, interagindo sob a ação de seus campos elétricos. A repulsão eletrostática fará com que, à medida que o tempo passa, eles estejam cada vez mais longe um do outro. Portanto, do ponto-de-vista de cada um dos elétrons, o campo do outro varia com o tempo. Não se trata desta dependência no tempo, conseqüência do movimento, o que estamos estudando aqui. Trata-se de uma dependência no tempo adicional a esta, e que aconteceria, por exemplo, se a carga de um dos elétrons fosse aumentando com o tempo. Se os dois elétrons estivessem no interior de um capacitor cujo campo elétrico fosse alterável por meio de um reostato, teríamos um campo com dependência explícita no tempo. Uma onda de luz que incide sobre um elétron, já citada acima, é outro exemplo de perturbação com dependência explícita no tempo. Neste caso, não há conservação da energia 27 e o hamiltoniano perturbado não terá, em geral, estados estacionários. Supõe-se, porém, que o hamiltoniano $\hat{H}_{0}$ os tenha, e o objetivo é calcular as funções de onda do sistema perturbado como correções aos estados estacionários do sistema não-perturbado.

Sejam

\begin{displaymath}
\psi_{k}^{(0)}(\vec{r}, t)=u_{k}(\vec{r})e^{-\frac{i}{\hbar}E_{k}t}
\end{displaymath} (595)

as funções de onda dos estados estacionários do sistema não-perturbado. Então uma solução arbitrária da equação de Schrödinger para o sistema não-perturbado pode ser escrita na forma
\begin{displaymath}
\psi = \sum_{k}a_{k}\psi_{k}^{(0)}
\end{displaymath} (596)

Vamos agora procurar uma solução da equação perturbada
\begin{displaymath}
i\hbar \frac{\partial \Psi}{\partial t}=\left(\hat{H}_{0}+\hat{V}\right)\psi
\end{displaymath} (597)

na forma de uma soma
\begin{displaymath}
\psi = \sum_{k}a_{k}(t)\psi_{k}^{(0)}
\end{displaymath} (598)

onde os $a_{k}$ agora, diferentemente daqueles da Eq.(597), são funções do tempo. Para ser mais esoecífico, seja $\psi_{n}$ a função de onda do sistema perturbado que é uma correção da função de onda não perturbada $\psi_{n}^{(0)}$. A equação (599) é agora escrita assim:
\begin{displaymath}
\psi_{n}=\sum_{k}a_{kn}(t)\psi_{k}^{(0)}
\end{displaymath} (599)

Levando a Eq.(600) à Eq.(598), e lembrando que as $\psi_{k}^{(0)}$ satisfazem a equação
\begin{displaymath}
i\hbar\frac{\partial \psi_{k}^{(0)}}{\partial t}=\hat{H}_{0}\psi_{k}^{(0)}\;,
\end{displaymath} (600)

obtemos
\begin{displaymath}
i\hbar\frac{\partial}{\partial t}\sum_{k}a_{kn}(t)\psi_{k}^...
...(\hat{H}_{0}+\hat{V}(t)\right)\sum_{k}a_{kn}(t)\psi_{k}^{(0)}
\end{displaymath} (601)

ou
\begin{displaymath}
\sum_{k}\psi_{k}^{(0)}i\hbar \frac{da_{kn}}{dt}=\sum_{k}a_{kn}(t)\hat{V}(t)\psi_{k}^{(0)}
\end{displaymath} (602)

Multiplicando ambos os lados da equação à esquerda por $\psi_{m}^{(0) *}$ e integrando, temos
\begin{displaymath}
i\hbar\frac{da_{m n}}{dt}=\sum_{k}V_{mk}(t)a_{k n}(t)
\end{displaymath} (603)

onde
\begin{displaymath}
V_{mk}(t)=\int\psi_{m}^{(0) *}\hat{V}\psi_{k}^{(0)}dq = V_{mk}e^{i\omega_{mk}t}
\end{displaymath} (604)

com $\omega_{mk}=\frac{E_{m}^{(0)}-E_{k}^{(0)}}{\hbar}$, são os elementos de matriz da perturbação, incluíndo as exponenciais que contêm a dependência temporal. Deve-se notar ainda que, como $\hat{V}$ depende explicitamente do tempo, as quantidades $V_{mk}$ são também funções do tempo. O fato de que $\psi_{n}$ é próxima de $\psi_{n}^{(0)}$ é expresso por
\begin{displaymath}
a_{nm}(t)=\delta_{nm}+a_{nm}^{(1)}(t)
\end{displaymath} (605)

Inserindo (606) em (604), temos
\begin{displaymath}
i\hbar\frac{da_{mn}^{(1)}}{dt}=\sum_{k}\delta_{nk}V_{mk}=V_{mn}(t)
\end{displaymath} (606)

Note-se que
\begin{displaymath}
V_{mk}(t)=V_{mk}e^{i\omega_{mk}t}
\end{displaymath} (607)

A equação (607) pode então, por causa de (608), ser escrita:

\begin{displaymath}
i\hbar\frac{da_{mn}^{(1)}}{dt}=V_{mn}e^{i\omega_{mn}t}
\end{displaymath} (608)

Integrando, obtém-se:
\begin{displaymath}
a_{mn}^{(1)}(t)=-\frac{i}{\hbar}\int dt V_{mn}e^{i\omega_{mn}t}
\end{displaymath} (609)

O caso mais importante é de uma perturbação com dependência periódica no tempo,

\begin{displaymath}
\hat{V}=\hat{F}e^{-i\omega t} + \hat{G}e^{i\omega t}
\end{displaymath} (610)

à qual devemos, evidentemente, impôr a condição de hermiticidade. Como
\begin{displaymath}
\hat{V}^{\dagger}=\hat{F}^{\dagger}e^{i\omega t}+\hat{G}^{\dagger}e^{-i\omega t}
\end{displaymath} (611)

e
\begin{displaymath}
\hat{V}=\hat{V}^{\dagger}\;\;,
\end{displaymath} (612)

segue que
\begin{displaymath}
\hat{F}=\hat{G}^{\dagger}
\end{displaymath} (613)

Para os elementos de matriz, temos a relação:
\begin{displaymath}
(G)_{mn}=(F)_{mn}^* \;\;,
\end{displaymath} (614)

ou seja,
\begin{displaymath}
V_{mn}=F_{mn}e^{-i\omega t}+F_{nm}^*e^{i\omega t}
\end{displaymath} (615)

Usando isto em (610), temos
\begin{displaymath}
a_{mn}(t)=-\frac{i}{\hbar}\int dt \left(F_{mn}e^{-i\omega t}+F_{nm}^*e^{i\omega t}\right)
e^{i\omega_{mn}t}
\end{displaymath} (616)

ou
\begin{displaymath}
a_{mn}(t)=-\frac{i}{\hbar}F_{mn}\int dt e^{i(\omega_{mn}-\o...
...}
-\frac{i}{\hbar}F_{nm}^*\int dt e^{i(\omega_{mn}+\omega)t}
\end{displaymath} (617)

e, integrando,
\begin{displaymath}
a_{mn}(t)=-\frac{i}{\hbar}F_{mn}\frac{1}{i(\omega_{mn}-\ome...
...m}^*\frac{1}{i(\omega_{mn}+\omega)}e^{i(\omega_{mn}-\omega)t}
\end{displaymath} (618)

ou ainda,
\begin{displaymath}
a_{mn}(t)=-\frac{F_{mn}e^{i(\omega_{mn}-\omega)t}}{\hbar(\o...
..._{nm}^*e^{i(\omega_{mn}+\omega)t}}{\hbar(\omega_{mn}+\omega)}
\end{displaymath} (619)

Esta expressão assinala que alguma coisa importante acontece quando

\begin{displaymath}
E_{m}^{(0)}-E_{n}^{(0)} = \pm \hbar\omega \;\;,
\end{displaymath} (620)

embora, estritamente, a teoria de perturbações não se aplique neste caso, já que os efeitos são grandes. Em todo o caso, é claro que a ação de um campo perturbador de freqüência dada por (621) é muito mais intensa do que para quaisquer outras freqüências. Este fenômeno é denominado ressonância.

Henrique Fleming 2003